Uma experiência de economia do cuidado e protagonismo das mulheres nos mercados comunitários em Tauá, CE.
Organização: Esplar – Centro de Pesquisa e Assessoria
Texto: Aline Moura e Cecília Figueiredo
Fotos: Aline Moura / Acervo ESPLAR
A experiência das mulheres da comunidade de Riacho dos Cavalos, município de Tauá no Ceará, mostra a importância dos mercados comunitários e a força das mulheres na produção de alimentos saudáveis na lógica da economia solidária.
A experiência do mercado comunitário de Riacho dos Cavalos em Tauá, no Ceará, é feita a muitas mãos. Além de comprarem os alimentos produzidos na própria comunidade, as mulheres trocam produtos e também fazem doações para famílias que precisam. Esta economia baseada na solidariedade garante alimentos de qualidade e mais frescos. Todas as mulheres sabem a procedência dos alimentos e os preços de compra e venda são justos para quem produz e para quem consome. Para elas, esse mercado representa autonomia financeira dentro da família.
Trabalho com o dia nascendo:
O dia de trabalho começa cedo para a agricultora familiar Maria de Jesus Elias de Araújo na comunidade rural Riacho dos Cavalos, em Tauá, município cearense localizado no Sertão dos Inhamuns. Ela ordenha suas vacas ao nascer do sol e tira em média 25 litros de leite por dia. Grande parte deste leite é vendido na própria comunidade e vai alimentar outras famílias vizinhas.
Maria tem 38 anos e quatro filhos. Sua dedicação à produção e venda diária de leite aumentou a renda da família e possibilitou melhorias no plantel com animais de qualidade. O dinheiro da venda dos bezerros é reinvestido na propriedade.
O leite de vaca é utilizado para consumo da família e vendido na comunidade e na vizinhança por R$ 2,50/Litro, uma fonte de renda significativa para a família. Maria administra as vendas através do aplicativo Whatsapp. As famílias da comunidade fazem encomendas e ela já sai de casa com a quantidade certa de produtos. O salário maternidade que agricultora recebeu no nascimento da sua primeira filha, em 2009, foi usado para a compra de uma moto.
Em 2011, com o dinheiro do salário maternidade do segundo filho, Maria comprou mudas de coqueiro. Hoje ela colhe os côcos que também são vendidos no mercado comunitário e em um ano renderam mais de três salários mínimos. No ano de 2020 a agricultora e sua família produziram 31 tipos de alimentos diferentes para consumo familiar, gerando uma renda equivalente a mais de um salário mínimo mensal. Além dos alimentos produzidos para consumo da família, as vendas de Maria também garantem fartura, diversidade e saúde na mesa de outras famílias de Riacho dos Cavalos.
Maria segue orgulhosa de suas escolhas e do trabalho que realiza:
“O leite é a melhor renda, todo mundo gosta, se tivesse todo dia 50 litros, venderia tudo”.
A experiência dela mostra que através da economia solidária é possível resgatar o valor humano do trabalho e encontrar novas formas de produzir, comercializar e consumir.
Dona Hermínia escuta o barulho da moto e já sabe que quem chega é Maria com o leite fresquinho que foi encomendado. A agricultora familiar Hermínia Nogueira da Silva, apelidada de Heroína, compra o leite de Maria de Jesus na porta de casa. Por sua vez, ela produz alimentos no quintal e no roçado que também são comercializados na comunidade. Heroína defende que a economia dentro da comunidade Riacho dos Cavalos seja solidária, uma forma mais humana e consciente de circular riqueza:
“Não é só o dinheiro não. Não se come só. Tem que repartir”.
O mercado comunitário de Riacho dos Cavalos é uma experiência de economia solidária realizada por mulheres e apoiada pelo Esplar. Segundo Marina Porto, assessora técnica do Esplar, a produção de alimentos saudáveis nos quintais traz não só autonomia financeira, mas também mais autoestima e poder de decisão. Através deste mercado comunitário, as mulheres se fortalecem na luta por mais igualdade.
O leite vendido por Maria vai alegrar o café que Hermínia está organizando para reunir a mulherada em mais uma roda de conversas sobre a importância da economia solidária e da autonomia econômica das mulheres da comunidade. Nestes encontros elas trocam experiências e fortalecem seus laços e seu compromisso com a comunidade e a luta feminista.
“Na economia dentro do modelo capitalista não há espaço para a solidariedade, há competição e visa-se o lucro. A economia dominante está cheia de linguagens inacessíveis porque não é para nós entendermos mesmo. É para acharmos que não tem outro modo de fazer, diferente do que a industrialização prega, os mercados pregam.” afirma Marina.
As mulheres de Riacho dos Cavalos constroem uma outra economia
“Essas mulheres estão construindo a utopia no cotidiano em cada gesto de guardar sementes e trabalhar a terra, buscando entender a realidade tão complexa da economia e dos mercados, utilizando seus conhecimentos tradicionais e construindo o conhecimento juntas” destaca Marina Porto.
Essa fotorreportagem é uma publicação da Rede Ater Nordeste de Agroecologia e recebeu financiamento do Fida, Funarbe, UFV, IPPDS e AKSAAM.
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